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Premiada poeta cubana é finalmente publicada na Brasil

Premiada poeta cubana é finalmente publicada na Brasil 

Reina María Rodrígues – vencedora dos prêmios Pablo Neruda e Casa de las Américas

O hogar das dívidas

     Mirando a distância, a meia leitura do poema, indago-lhe – existe livro que não é Ilha? Mesmo na estante preenchida por livros, mesmo na voluntad da criança curiosa que os põe abertos uns sobre os outros, incerta do que ler primeiro… Não está presente ali, ainda assim, a cúspide de um inescutável, lato oceano que a todos separa?

     Unidade é aquilo que pedimos ferventemente – mas que dói tanto. Deparar-me com um livro uno, úmido de coesão, como é o de Reina María Rodríguez, é experiência desprotegida de encontro e desilusão. Pois a unidade, única força capaz de encher de lágrima os dutos da linguagem, é também a que se revela – e a cada um de nós – como Ilha. Diz a poeta em uma de suas linhas: O aqui que o confronta é sempre o mesmo: um hiato perfeito.

     Reina, que acabou de me ensinar isso em seus escritos, parece olhar para sua poesia (para o mundo) com uma ternura furtiva, idioma que só ela conhece. Poesia que tenta crescer para além das paredes dos versos. Que abre o manto e descobre que, qual seja a direção tomada, chegará a mar. Que fará? Dará a volta ao redor de sua impossibilidade? Ou esperará, entregue ao ofício de existir? Vivi quase meio século com vocês (ali, quietinha).

     Das agruras de se nascer numa ilha, poder ser machucada é uma delas. Os limites, por mais que tentem, não podem impedir os cortes. É-se descartada, embrutecida, paralisada. Retorna-se diferente, com manchas do tempo, para, no presente (no passante), conjugar o passado. E podia tocar gritando / o que agora não posso / por ser decente, velha / machucada. A música ecoa a culpa, nascente, de se tocar o piano com tanta dor.

     O chão pode parecer pouco, e a intempérie não faz calar, mas construir é tão parte do destino quanto qualquer outro verbo. A pequenez só escancara que existe algo a se perder. Só há dívida… se há algo a se perder. Como relatam as vigas do lar, existir é suportar o desalento do peso. E o peso do desalento, acrescentariam os humanos. Mas alguém já perguntou se podem as vigas sustentar… um peso que está abaixo delas? Como o título sustenta / o peso do poema?

     Remorsos para um cordeiro branco é antologia da materialidade do que ninguém acredita, assim como o limite é a pele do ser.

     Resiste, na poeta, a força para vociferar: Fora, marcas. Endivida-se para botá-las pr’além do umbral. Olhe de soslaio quem nunca foi acometido pelo arroubo de expulsar as marcas que o mundo escreve em nossos corpos. No fundo, é um pedido. A necessidade humana que toda Ilha tem de transformar em cais o seu hogar.

– João V. L. França, psicólogo e escritor.

 

PARA MUITO ALÉM DO CORDEIRO BRANCO

Entre brandos animais e temáticas de paz e inocência, Reina dança ao som de piano e cultura.

A poesia de Reina é amparada pelo delicioso prazer estético do mar de Malecón, das ruas, avenidas, bairros, cigarro, bebidas de Havana, suportadas pela poesia que transpira da cidade cubana. Sendo assim, seus poemas, às vezes narrativos, aproximam-se da fluência da prosa, flertando com os contos, numa hábil demonstração de versatilidade.

A poesia desta autora cubana, ganhadora de prêmios como o Pablo Neruda (2014, Chile) e o Casa de las Américas (Cuba, 1984), aborda histórias pessoais e da Ilha de Fidel: vestígios do passado, descrições de quadros e imagens, flagrantes de cenas domésticas. Uma variedade de temas que pode surpreender o leitor que, por instantes, pensou tratar-se de um livro comedido ou brando por conta da referência ao “cordeiro branco” no título.

Paz e inocência exaltadas nesta obra não resultam de uma ingenuidade pueril, mas sim – como afirma Alexandra Vieira de Almeida, crítica e mestre em Literatura – de “uma voz que se expõe e mostra as pessoas e coisas que estão à sua volta. Reina não esconde as histórias do peito, repletas de conhecimentos das artes, das referências literárias, dos seres, dos lugares e dos objetos”.

Já para a escritora Raquel Naveira, que assina o texto de orelha, estes versos são rítmicos, harmônicos, uma vez que a autora doma o instrumento musical, que, por sua vez, se revela como quase uma entidade própria sentida por meio de suas notas, em meio à “dor de fusas”, “entre um compasso e outro”.

 É fácil reconhecer a musicalidade e a profundidade da poesia de Reina e com elas ficar encantado. Prazeroso para o leitor poder compartilhar da intimidade literária de uma mulher tão sensível e culta, pois em “Remorsos para um Cordeiro Branco” não são raras as referências a poetas, escritores e pintores, tais como Antonin Artaud, Alexandre Pushkin, Tintoretto, Goethe, entre outros. Uma poesia de intensa vida interior, mas ao mesmo tempo enriquecida pela vida que a rodeia. Uma poesia com mensagens claras, mas ao mesmo tempo cifradas pelos acontecimentos do mundo. Uma poesia que faz deste livro um universo próprio de sombras e luz – remorsos e contentamentos.    

SERVIÇO

Título: Remorsos para um cordeiro branco

Autor: Reina María Rodrígues

Especificações: 1º edição, 2018 – 14×21, 132 páginas.

Preço: R$ 40

Link para compra (obra entrará em pré-venda a partir do dia 21 de maio):

www.editorapenalux.com.br/loja

 

Reina_por_Elis Miralles

SOBRE A AUTORA 

Reina María Rodríguez nasceu em Havana em 1952. É formada em Licenciatura e Literatura Hispano-americana e em Museologia. Poeta e narradora, tem mais de vinte livros publicados. Foi traduzida em diversas línguas, como o inglês, o italiano, o francês, o alemão, o russo, o árabe, o vietnamita, entre outras. Deu cursos e palestras nos Estados Unidos e na Europa. Recebeu muitos prêmios importantes, entre eles o Casa de las Américas de 1984; o Prêmio Nacional de Cuba de 2013; o Pablo Neruda do Chile, em 2014. Vive em Havana, na cidade velha, próximo ao Malecón, bem perto do mar.

 

 

 

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