Sobre húmus, milésima demão nas paredes de estar perdido e a rebeldia de desaprender.
Para meu irmão de arte marcus groza
Escrever é como dar primeira demão de tinta em parede ociosa.
Logo se descobre que não será possível cobrir, apagar, findar toda a tinta anterior. Entre as inúmeras demãos, é preciso lixar, raspar, verter fissuras com massa amorfa, apagar possíveis mapas e trilhas imaginárias que se formam e se acumulam entre noites de insônia e desespero. A cada demão, uma nova textura, por vezes inédita e volátil. Ainda assim, haverá rachaduras, anomalias, infiltrações, mofo e bolor entre tons de imperfeição. Baratas, formigas e aranhas criam seu próprio roteiro de domínio em parede úmida. É preciso mais do que prumos e sarrafos para se reconstruir paredes geométricas, planas e duradouras sem que se desprendam a cada abalo sísmico.
Não há chão de terra batida. O solo que pisamos é frágil, instável e devorador. A paisagem que se forma atrai pelo perigo camuflado e aconchegante. É possível que haja fosso, lodo, crateras submersas entre vegetação em decomposição, areia movediça e bichos vorazes prontos pra dar o bote em tudo quanto é frágil.
“Sob as encostas se acumulam os excessos. Todo tipo de lixo fabricado pelo desejo de consumo se aglomera como carne podre em matadouro formando montanhas de inutilidades pra nos convencermos de que somos tal coisa e, que agora somos totalmente dependentes”…f.s
I
Imagine as melancias que crescem sem aquela mancha de terra
II
E tudo quanto amadureça por igual!
III
Fosse de novo novo esse
Gesto coletivo
De encostar a planta dos pés.
…
Então, tudo que temos
são folhas e frutos que caem aleatoriamente, formando uma vegetação que se decompõe em meio a restos animais. E então, tudo quanto amadurece é susceptível de ser devorado e virar adubo. E assim, ficar fadado a toda e incomensurável sorte de tudo quanto apodrece e germina.
selmer/fer