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Os rios que nos roubaram

OS  RIOS  QUE  NOS  ROUBARAM

“Era em São José dos Campos
e quando caía a ponte
eu passava o Paraíba
numa vagarosa balsa
como se dançasse a valsa.”

(“A Flauta que me Roubaram”, de Cassiano Ricardo)

 

Em “A Flauta que me Roubaram”, Cassiano Ricardo relembra sua infância vivida em São José dos Campos e menciona o rio que compunha a bucólica paisagem daquela pacata cidade. Um rio  limpo e piscoso, imagem impensável nos dias de hoje, quando convive com todo tipo de poluição. Época feliz na vida do poeta, em que “só havia pirilampos, imitando o céu nos campos, e tudo parecia certo, pois o horizonte estava perto”.

Aquele cenário transformou-se radicalmente, mas não por culpa  dos poetas. Outros foram os responsáveis. Muitos dos principais  rios deste país estão com a qualidade de suas  águas seriamente comprometida pela poluição industrial, pelo lançamento de esgotos sem tratamento, portos de areia e por aí vai. Nem as  nascentes são poupadas.

A Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental (ABES), divulgou recentemente um relatório contendo dados alarmantes sobre saneamento básico no Brasil. São  informações sobre 1.868 municípios, incluindo as capitais, abrangendo 68% da população brasileira.

De cada 100 litros de esgotos lançados no meio ambiente, 48 litros não são tratados. Significa que a maior parte desse volume não recebe tratamento algum  e seu destino são os cursos d´água ou então fossas quando não há coleta de esgotos.

100 milhões de brasileiros usam fossas. 35 milhões não têm acesso a água potável. Estes números referem-se apenas a resíduos  domésticos. Não estão computados os dados sobre a poluição industrial, muito evidente nas regiões Sul e Sudeste. O Rio Paraíba é um  exemplo muito próximo. Também  é o caso do Tietê que, há anos vem recebendo investimentos para sua despoluição e até agora os resultados são pífios.

O fato de o Brasil ser a oitava economia do mundo e ocupar a 106ª.posição no ranking internacional de saneamento, demonstra que aqui a preocupação maior é com o tamanho do PIB. Parece que os índices de mortalidade infantil e as condições gerais de saúde e higiene da população, foram relegadas a plano secundário pelos nossos governantes. É importante lembrar que a ONU reconhece o saneamento básico como um direito humano. Mas, “cano embaixo da terra não dá voto”.

A conclusão que chegamos  é que muitos rios nos foram roubados em nome de um progresso  sem sustentabilidade. Quando nós os teremos de volta ?!

Por Gilberto Silos

 2019

4 Comments

  1. Beth, obrigado pelo comentário. É sempre um estímulo pra gente continuar sonhando e escrevendo sobre o que sonha, que às vezes carrega o pesadelo em que se converteu a realidade. Beleza o vídeo ´´Cassiano Itinerante“, com esse grande artista que é o Claudio do Vale. Se não me engano no ano passado o Entrementes publicou minha crônica sobre o ´´Sertania Nordestina“, belíssimo musical do Claudio. Valeu Beth.

    Abraço fraterno
    Gilberto

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