Se me levanto
Sofro.
Pela janela um sopro. Pela janela à distância. O longe.
Aqui dentro,
Um corpo.
Aqui dentro um copo.
Cheio do meu vazio.
Repleto de silêncio
O espaço,
Um espasmo
Um choro.
Na rua o mundo interditado.
Aqui dentro eu.
Minha frustração,
Meu medo.
Meus livros.
Minha música.
A comida que me enche,
O álcool que me engana.
Aqui dentro.
Dentro de mim o oco.
O nada.
Só a janela que me provoca,
A porta que me atiça.
Fugir pro risco.
Riscar a rua com meu corpo em riste.
Morrer com o vírus.
Morrer sem o vírus.
Pendurado à janela.
Desejos, esperanças… medos.
Sentimentos tristes,
Uma flor na lapela.
Um aceno, um abano.
Desenhar, escrever no vidro que afasta e protege.
Signos vários. Com os dedos.
Com a mão apagar.
O ano todo. Seria bom.
Mas aqui é o agora.
E a música enclausurada sofre.
O livro enclausurado sofre.
A TV e sua luz … não bastam.
Há um limite para os passos.
Há um resumo de todos os traços.
Há um rascunho de cabelos desgrenhados,
Um pijama de semanas,
Uma mesa de meses,
Uma bagunça infinita.
Quanto mais organizado mais bagunçado.
Mais diminuta a vida.
Reduzida.
Repetitiva.
No espelho.
Nos vidros da janela.
Bom seria escorrer pelas frestas,
Pelos ralos,
Deixar a vida ser conduzida,
Induzida às frinchas de qualquer possibilidade.
O relógio sem sentido gira seus braços ridículos.
Nos enreda com um tempo que parece não estar ali.
Tempo vago, vagar no tempo.
Escrever um texto, então.
Riscar palavras pra marcar as costas do tempo.
Fugir do espaço da casa.
Saltar pela janela.
Mesmo que seja em letra.
Em palavra e verbo.
Enfrentar o vírus com o verbo.
Vibrar o verbo na rua.
Fugir pelo verbo,
Para além do vírus.